alfabeto

30.9.06

J. T. Parreira


Poema para um futuro Outono


Quero que saibas que ainda
não tens saudades minhas

Espera o tempo
em que a luz do outono
vai entrar
por uma janela cinzenta

E um cristal emergirá do silêncio
das tuas lágrimas

Espera
que as praças fiquem
com a luz amarela das folhas

Nem mesmo no dia em que rostos
parcialmente escondidos
por detrás de lentes tristes
sigam o corpo

ainda não terás saudades minhas

A saudade é uma névoa que inicia
levantar-se sobre as coisas
que sempre dividimos

Uma pequena dor
transmitida no rosto de um filho

uma frase
incerta na boca de um neto
como um passo que desliza
para a queda

um livro que se abra e deixe
cair uma palavra

qualquer coisa que vá bater
no fundo dos teus olhos.



leia mais J.T. Parreira aqui.

18.9.06

Yara Daher, porque ela partiu


Deslumbramento

Conhecer o mistério das palavras,
pausa e espaço resgatar,
no reflexo baço da sintaxe
vislumbrar
o jogo ardiloso da canção.

Labirinto aparente de combinações,
arabesco de buscas e confirmações,
gozo caprichoso e contundente
de quem se mira no espelho
por detrás.

Fosso fosco da linguagem,
jogo de sombras e transparências:
cristal.


Onde você estiver, amiga, minha saudade e meu beijo. Sempre.

8.9.06

Um vôo à letra Y:


Amantes deixam impressões digitais um no outro


Amantes deixam impressões digitais um no outro,
cheias de evidências físicas, palavras sem fim,
testemunhos, um par de calças vincadas, um jornal com a data exata,
e dois relógios, o dele e o dela.
Toda manhã eles traçam o contorno um do outro
como a polícia marca com giz a posição do corpo na estrada.
Amantes rendem um o outro,
amantes reservam o direito de manter silêncio.
Se e quando se separam,
compõem um esboço policial de suas caras
e um contorno pra que possam dizer:
E esse! E essa!


Yehuda Amichai