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20.12.05

Miguel Torga, porque é Natal


Dia Santo


Dia de sol e de Natal;
Andam guerras no mundo e dói-me a vista;
Mas, com Deus no Marão sem neve, não há mal
Que resista.

De mais, fora do tempo, este latim
Que o padre Bento sabe, basta
Para me transceder a mim
E a quantas más notícias o correio arrasta.


S. Martinho de Anta, Natal de 1940.


5.12.05

Henrique Rodrigues Pinto


Poemas Simulados a Partir do Mesmo Mote Tosco (VI)


Mote: Prefeitura paga R$ 3,00 por quilo de caramujos, que estão infestando a cidade.

À maneira de Álvaro de Campos

O Dorso

Nada resta!, já dizia antes que ele se me apresentasse
Como um acúmulo de horizontes preplexos.
Hoje, ah, hoje é tão vago quanto a própria idéia de consciência.
Não me peçam planos.
Que eu os trace apenas como pontos de fuga, no entanto,
E eis que teremos à frente uma vastidão estéril.

No dorso, trago um universo mínimo, tal como
Um caramujo que não sabe de si
E por isso mesmo procura sem pressa o próprio abrigo.

Não há nada a sentir, apenas um cansaço imenso
Repelindo-me com suas preces insidiosas.
Sentir? Não basta. É inútil sentir.
Daí as alternâncias da noite com o dia, não há nada além.
Regateio diante dos caminhos, meu fardo
É por demais denso para que me permita outras escolhas.

Tenho um invólucro sobre mim, não asas.
Perdoem-me a lentidão
Assim como eu aceito de bom grado o sepultamento
Inexpugnável das horas.
Não lastimo, sequer sinto o que não chega a existir.
Carrego uma casa vazia, sem alma nenhuma dentro.


leia mais Henrique aqui.

Holografia


Entre a retina e a tarde, brilha trêmula a tua imagem dentro e sobre o pôr-do-sol.